Consigo comprar casa sozinho em Portugal?
Se tens entre 18 e 35 anos, possivelmente achas que é impossível sair da casa dos teus pais. Neste artigo, ajudamos-te a perceber melhor como comprar casa sozinho.
"Mãe, vou sair de casa... para a minha própria casa!".
Esta frase parece impossível dizer.
Trabalhas há vários anos, o teu salário é próximo do miserável, já queres viver sozinho…só que o mercado parece que não te está a ajudar!
Ou então és freelancer, tens o teu próprio dinheiro, mas nem sonhas morar sozinho? Ter a minha casa não vai acontecer.
Queres comprar casa, estás por tua conta e ter o teu próprio espaço parece uma Missão Impossível (e tu não és o Tom Cruise!).
Identificas com esta situação? Então este artigo é para ti. Vamos desmistificar o processo de comprar casa sozinho em Portugal e mostrar-te que, sim, é possível.
Sou jovem e solteiro. Consigo mesmo comprar casa sozinho?♟️
Resposta curta: Sim, consegues!
Resposta longa: Em Portugal, não existe qualquer impedimento legal para comprares casa sozinho, independentemente da idade (desde que sejas maior) ou estado civil. E já deves ter ouvido de outros jovens, como tu, que conseguem sair de casa dos pais antes dos 30 anos.
O que precisas de saber? O processo de crédito à habitação e o teu perfil financeiro!
Pedir dinheiro ao banco 🏦
Para comprar casa, a maioria das pessoas recorre a financiamento bancário.
O banco fica contente: pode ganhar um novo cliente. Só que tu não estás a pedir 10 mil euros, estás a pedir 100 mil ou 150 mil euros. O banco fica apreensivo. Tem uma operação interessante e ao mesmo tempo arriscada.
É aqui que entra a “due dilligance” (traduzindo: a parte da papelada!). Os bancos querem saber a situação toda: onde trabalhas, qual é o teu contrato de trabalho, quanto ganhas, quanto gastas e que casa queres comprar.
O que procuram? Duas coisas: capacidade e estabilidade. Os documentos são analisados para responder às perguntas:
Esta pessoa tem a capacidade de pagar uma prestação, todos os meses, nos próximos 30 anos?
Se os juros ficarem mais altos e a prestação aumentar, esta pessoa vai continuar a cumprir os pagamentos do empréstimo?
Este é o primeiro passo, saberes o que é que os bancos procuram numa operação como esta.
E se for freelancer? Os bancos emprestam-me dinheiro? 🦸♀️
Sim, os bancos fazem créditos à habitação a quem é freelancer.
Para os bancos, um freelancer (ou recibos verdes) é uma pessoa que tem rendimentos irregulares. Pode ganhar 500 euros este mês, no próximo 3000 e no seguinte 100.
Comparando com uma pessoa que tem um contrato sem termo e ganha 1000 euros por mês, o banco pode “gostar” mais da pessoa que ganha menos, pois o dinheiro vai cair na conta certinho.
Lembra-te: o banco está à procura de previsibilidade. Mas não comeces já a desesperar! É possível. Então o que deves mostrar?
Aqui estão as estratégias que te ajudam a melhorar o teu perfil financeiro como freelancer:
1. Histórico de rendimentos consistente: apresenta pelo menos 2-3 anos de declarações de IRS que mostrem rendimentos estáveis e/ou crescentes.
2. Diversificação de clientes: se for o caso, mostra que não dependes de um único cliente. Ter 4-5 clientes regulares é melhor que ter apenas um que representa 80% dos teus rendimentos.
3. Contratos em vigor: apresenta contratos ou acordos que garantam rendimentos futuros.
Preciso mesmo de um fiador? 🧑🏽🤝🧑🏽
É verdade que alguns bancos podem-te pedir um fiador para concretizar a operação. O papel de fiador é importante pois é uma pessoa que garante o cumprimento de um empréstimo quando o devedor principal não o consegue fazer.
No fundo, o banco está a pedir mais uma garantia de que vai ter o empréstimo pago. É provável pedirem fiador quando acontecem algumas destas situações:
Os teus rendimentos são insuficientes para a prestação.
Tens histórico de incumprimentos (uma prestação em atraso tem impacto!).
És muito jovem (menos de 25 anos) com pouco histórico de crédito.
Há formas de contornar isto? Sim, há formas de contornar. Tais como:
Valor de entrada maior: ao dares um valor de entrada acima dos 10%, estás a pedir menos valor de empréstimo, logo o teu risco diminui.
Rendimentos complementares: omstra rendimentos de investimentos ou rendas, para te conhecerem melhor.
Que contas devo fazer antes de ir ao banco? ➗
Chegamos à segunda parte: conheceres a tua vida financeira.
Para estares mais bem preparado, a primeira coisa que deves saber é: qual a minha taxa de esforço? Um exercício rápido é aplicar a regra dos 30%, já que a prestação mensal não deve ultrapassar 30% do teu rendimento líquido mensal.
Exemplo prático:
Rendimento líquido mensal: 1.500€.
Prestação do crédito à habitação: 0€.
Prestação crédito automóvel: 250€
Taxa de esforço: (250 / 1500) x 100 = 17%.
A tua taxa de esforço atual é de 17%, estando nesta situação, tens margem para pedir um crédito para a compra de casa.
Para além da prestação que vais pagar, vais precisar de dar algum valor de entrada (10%-15% do valor de compra do imóvel) e uns custos extra, que vão aparecendo durante o processo:
IMT (Imposto Municipal sobre Transmissões): 0-8% do valor.
Imposto de selo: 0,8% do valor.
Escritura e registos: 1.000-1.500€.
Avaliação bancária: 300-500€.
Ao fazeres as contas, para uma casa de 150.000 euros, considerando o valor de entrada de 15% e despesas, podes estar a olhar para 28.000 euros.
Contas feitas, está na altura de pedires simulações.
Vai ao teu banco e pede uma pré-aprovação de crédito à habitação. É o que te conhece melhor, por isso podes começar por aí.
Vai-te pedir alguns documentos para perceber se pode não avançar com um empréstimo e especialmente de que valor. Considera isto um “sim” inicial.
Com esta aprovação, vais conseguir visitar casas que estejam dentro do teu orçamento e caso faças uma proposta de compra o processo com o banco será muito mais célere.
Vais ficar-te por aqui? Não. Vai ao mercado e pede mais propostas a outros dois bancos. Cada banco tem critérios diferentes.
Ao compares as propostas, tira nota destes valores:
Spread.
Taxa de juro aplicável.
Taxa Euribor na proposta (geralmente vais ver a 6 meses ou 12 meses).
Custos para formalizar: comissão de dossier, comissão de avaliação, comissão de formalização.
Seguros obrigatórios.
Taxa anual efetiva global (TAEG) - custo anual total do empréstimo para o cliente.
Montante total imposto ao consumidor (MTIC) - custo total com o crédito.
Custo por amortização antecipada.
Aconselhamos a olhar para o MTIC, uma vez que te diz exatamente quanto vais pagar pela totalidade do empréstimo. O valor mais baixo geralmente indica-te quanto menos dinheiro vais gastar.
Garantia do estado ajuda-te a comprar casa a 100% 🏡
Atualmente os bancos podem emprestar até 90% do Loan-to-Value (LTV) do valor da avaliação do imóvel. É importante saberes
Exemplo: Valor do imóvel: 150.000 euros.
90% LTV: 135.000 euros - valor máximo de empréstimo.
Contudo, há boas notícias! Se tens até 35 anos, há dois apoios do Estado que te podem ajudar:
Garantia pública (financiamento a 100%), que permite comprar casa sem entrada
Isenção de IMT e Imposto do Selo, que reduz os custos iniciais de compra de habitação própria e permanente
A Garantia Pública está disponível para jovens que querem comprar a sua primeira habitação própria permanente. Este novo regime permite contornar a regra de financiamento 90% do LTV, pois o Estado presta uma garantia de até 15% do valor de trasação do imóvel (este valor não é grátis, é uma facilitação para a compra). Isto permite a muitos jovens poderem avançar com a compra de imóvel quando não têm o valor de entrada disponível.
Já a isenção de IMT e de Imposto de Selo permite-te poupar mais umas centenas de euros no dia da escritura, ajudando a reduzir o valor de que precisas para finalmente compares a tua casa. Lembras-te dos 28 mil euros? Se não parages IMT ou Imposto de Selo, este valor desce consideravelmente, facilitando as tuas contas.
Conclusão
O teu sonho de sair da casa dos pais começa aqui. Se estás mesmo interessado em comprar casa é muito importante:
Conheceres a tua situação financeira atual, ao calculares a tua taxa de esforço.
Estuda como funciona o processo de crédito à habitação para saberes o que os bancos vão pedir.
Percebe se consegues beneficiar das medidas de apoio do Estado.
Fazer contas à vida (literalmente!)
Avança para uma pré-aprovação do banco para saberes que imóveis podes procurar.
Difícil? Sim, é, especialmente porque queres comprar casa sozinho. Porém, é possível, se conheceres a tua situação e fores bem preparado!
Trabalho de casa 🏡
Se chegaste até aqui, é porque estás sério sobre comprar casa.
Mesmo que estejas sozinho, é possível. Pode ser mais difícil ou demorar mais do que estavas à espera, vais conseguir!
Para concretizares este objectivo, este é o teu próximo trabalho de casa:
Calcula o teu orçamento real e qual é o teu património.
Organiza toda a documentação que te vão pedir (aconselhamos a digital para poderes comunicar por email).
Pede propostas de pré-aprovação de crédito à habitação a 3 bancos diferentes.
Pesquisa imóveis dentro do teu orçamento em pelo menos 3 zonas.
Agenda visitas a 5-10 casas para perceberes o mercado.
Partilha nos comentários: qual destes passos te assusta mais? A comunidade do OAF está aqui para te ajudar!
Gostei muito do artigo e de todo o trabalho que têm feito até agora — é uma grande ajuda para quem está a tentar navegar pelo mundo financeiro. Queria só partilhar algumas preocupações que tenho sentido, mais como observação pessoal:
- Preços: Os preços das casas continuam a aumentar bastante em Portugal, muitas vezes de forma desproporcional em relação aos salários.
- Qualidade: Muitas casas, mesmo caras, acabam por ter qualidade de construção baixa ou necessidade de reparações logo no início, o que significa mais custos.
- Poupança: Com o custo de vida a subir em várias áreas, poupar para a entrada e para todas as despesas extra tem sido cada vez mais difícil para muita gente.
- Custo de vida: Além da prestação ao banco, tudo o resto (alimentação, energia, transportes) está mais caro, o que torna a taxa de esforço algo enganadora se não se considerar o peso de todas as outras contas.
Seria interessante ver estes temas também explorados, porque acho que fazem parte da realidade de quem quer comprar casa sozinho hoje em dia. Parabéns mais uma vez pelo trabalho claro e útil!
Gostei muito deste artigo, mas ficou a faltar uma secção sobre como se conseguimos ou não depende onde queremos comprar casa. Como pessoa que já anda há um mês a ver casas Lisboa e nem é para comprar sozinha, diria que em Lisboa está mesmo muito difícil para quem não tenha entrada ou um ordenado decente.